O simbolismo criativo do inverno tem suas peculiaridades, como uma importante fase dos ciclos da natureza.
Absolutamente, todo o tipo de vida depende dos ciclos da natureza, seja em maior ou em menor grau.
Para nos aprofundarmos mais sobre isso, este artigo vai falar sobre como podemos viver o simbolismo do inverno criativamente.
Especialmente, como podemos nos beneficiar ao entrar em contato com esses símbolos criativos, através das imagens e linguagens artísticas.
As fases e os ciclos da natureza já estão incorporados na nossa cultura local e ocidental. Mas resta questionar como interagimos com eles.
Como você interage com a estação do inverno?
Provavelmente as respostas mais comuns que vêm à cabeça são:
- “Sentindo frio”
- “Usando roupas mais quentes”
- “Buscando lugares mais quentes e aconchegantes” etc.
Porém, há muito mais por trás disso. Há muitos símbolos criativos que a estação fria do inverno nos traz.
Simbolismo do solstício de inverno
Especialmente o momento solstício de inverno traz o simbolismo da escuridão que triunfa sobre a luz.
Devido ao movimento de translação da Terra ao redor do Sol, há uma diferença de iluminação nas áreas do planeta, devido ao eixo de inclinação da Terra.
Como consequência, a superfície terrestre ilumina-se de maneira desigual. O resultado é que temos partes mais iluminadas e outras mais escuras no decorrer das quatro estações do ano.
Conforme o sol se inclina mais para o norte do Equador, as temperaturas e a incidência de luz diminuem nas regiões abaixo.
Gradativamente, os dias se encurtam e as noites se alongam no hemisfério sul.
Efetivamente, o ponto máximo desta fase cíclica é quando temos a noite mais longa do ano, conhecido como o solstício de inverno. Então, sabemos que entramos na estação mais fria e escura do ano – o inverno!
Simbolicamente, os ciclos da natureza se contrastam: nascer/morrer; luz/escuridão; quente/frio etc. Tais contrastes são simbolizados pelos solstícios.
Dessa forma, no momento do solstício, uma energia se extingue, ao mesmo tempo que outra começa a se desenvolver.
Assim, o solstício de inverno corresponde à meia-noite e representa a maior ausência de luz, contrastando com a maior presença de escuridão. Essa escuridão está associada a outras imagens, tais como a cessação de movimento, a diminuição da vivacidade da natureza.
Por exemplo, observa-se que no inverno as sementes não brotam, enquanto árvores e plantas perdem suas folhas e não dão frutos.
Com efeito, o solstício anuncia uma diminuição de energia na natureza, com a aproximação de dias mais frios e noites longas. Por isso, a reação mais instantânea é buscar o recolhimento, a concentração e o silêncio. Pois, simboliza um momento de desaceleração.
Contudo, o simbolismo do inverno é criativo e dinâmico. Pois os dias começam a se alongar com o passar do tempo.
Desse modo, sabemos literalmente que a escuridão não é para sempre.
Ao mesmo tempo que o inverno simboliza um movimento de concentração, tem na sua essência o simbolismo da evolução contínua. Em outras palavras, a estagnação do inverno é uma fase necessária para gera-se um novo começo – como o momento da ‘quietude’ no IChing.
Então o solstício de inverno é também um momento de transição:
Entre tudo o que dá início e fim às coisas, nada é mais glorioso que a quietude
– IChing –
Portanto, o solstício de inverno significa mais um ponto de virada!
O simbolismo criativo da estação do inverno
O simbolismo criativo da estação do inverno representa tudo o que fica adormecido na terra silenciosa.
Oportunamente, é um tempo sagrado de descanso e reflexão antes do despertar e da lenta construção em direção a um novo ciclo que está para iniciar.
A energia do inverno é a de ir para dentro. É a escuridão e o silêncio férteis para novas inspirações e coisas novas que podem eventualmente emergir.
Sem dúvida, é um momento de escuridão e de estagnação momentânea.
Mas não há nada de ruim nisso!
Culturalmente, somos condicionados a suprimir a escuridão.
Por isso, quando as emoções negativas surgem, nós a consideramos inconvenientes, desconfortáveis, ou pior, podemos até nos sentir desajustados por senti-las.
Quando tememos nossa própria escuridão, nos desligamos de uma fonte essencial de nosso próprio poder pessoal.
Ao contrário de fugir dessas emoções e negar a escuridão, podemos entrar em acordo com elas.
Pois, a chave não é deixar a escuridão dominar nossas vidas e nossos pensamentos, mas entender que a escuridão pode ser um dos maiores catalisadores para o crescimento e a transformação pessoal.
Catalisar significa dar início a um processo, de maneira a estimulá-lo ou incentivá-lo.
A escuridão e o frio do inverno
Necessariamente, a escuridão e o frio do inverno simbolizam hibernação.
Porém, isso não significa que há ausência total de movimento e de energia.
Pelo incrível que pareça, a estagnação, ou hibernação, é positivamente um movimento necessário para a concentração de energia e geração de um novo impulso. Dessa maneira a estagnação catalisa a geração de um progressivo movimento.
Por outro lado, a nossa atitude com relação a esta energia simbólica é que deve ser refletida.
Se agimos de maneira a rejeitá-la ou negá-la, essa estagnação pode nos imobilizar ao invés de catalisar forças.
À medida que vinculamos conscientemente nossa consciência aos ciclos da natureza, nossa compreensão de nossos próprios ciclos de crescimento pessoal começa a se aprofundar.
Portanto, é entrando em contato com o frio e a escuridão do inverno que aprendemos a entrar em contato com as nossas emoções obscuras e muitas vezes não reconhecidas, por serem por nós rejeitadas.
Simultaneamente, entramos em contato com o nossa energia potencial construtiva de resistência e capacidade de concentração.
Certamente, a melhor forma de lidar criativamente com tais emoções e potencial energético é através das representações simbólicas, que encontramos em todas as artes.
A estação do inverno nas artes
Frequentemente, os tons cinzentos e escuros prevalecem nas pinturas de inverno. Esta gama de cores simbolizam o recolhimento.
Desde as paisagens cinzentas com neve e avalanches até o colorido de Kandinsky em sua combinação sinestésica das cores, o inverno exerce um poder dramático que mobiliza o artista que cria e sensibiliza o observador.
Invariavelmente, veremos nas pinturas as alegorias de dias curtos, ventos frios, caminhadas geladas e malhas pesadas.
Alguns artistas optam por refletir as emoções humanas no gelo, neve e névoa de maneira abstrata.
Em contrapartida, outros mostram uma visão realista do inverno, desde a luz da manhã nas árvores cobertas de gelo até a arquitetura da cidade coberta de neve.
Enquanto uns, como Turner e Briton, representam bem a impotência sob a força sublime da natureza invernal, outros voltam seus olhares para as paisagens urbanas vazias, ou com no isolamento da cidade moderna.
De qualquer forma, são movimentos antagônicos entre dinamismo e hibernação que estão presentes.
A sensação do inverno através da música
Da mesma forma, a sensação de dinamismo e descanso do inverno estão presentes através da música.
Por exemplo, nas quatro estações de Vivaldi, o concerto do inverno representa bem esta dicotomia de emoções.
Sobretudo, o tema do inverno de Vivaldi é o mais dramático e impactante:
No meio de cortantes ventos os dentes tremem de frio.
Andamos com cuidado no caminho gelado com medo de escorregar e cair
isto é o inverno, que não obstante tem as suas delícias…
O frio do inverno é poético
O frio do inverno é poético mesmo quando o encontramos na prosa.
Aliás, esse é o caso da brilhante imagem que James Joyce desenha com as suas palavras escritas e descritas em sua obra Dubliners.
Nada melhor do que este maravilhoso escritor para nos revelar o inverno:
When the short days of winter came, dusk fell before we had well eaten our dinners. When we met in the street the houses had grown sombre. The space of sky above us was the colour of ever-changing violet and towards it the lamps of the street lifted their feeble lanterns. The cold air stung us (…) Our shouts echoed in the silent street *[i]
– James Joyce, Dubliners –
[i] Tradução livre: Quando os curtos dias de inverno chegam, o crepúsculo cai antes que tivéssemos comido nossos jantares. Quando nos encontramos na rua, as casas parecem sombrias. O céu acima fica de uma cor violeta, e as lâmpadas da rua se destacam com suas fracas lanternas. O ar frio nos machuca (…) Nossos gritos ecoam na rua silenciosa. James Joyce, Dubliners.
Contudo, a poesia também é capaz de conjurar sensações e emoções do inverno.
Imagens poéticas evocam sentimentos
Antes de mais nada, a poesia é fazedora de imagens, pois evocam sentimentos, emoções e lembranças:
(…)
A custo rompe o sol; a custo invade
O espaço todo branco; e a luz brilhante
Fulge através do espesso nevoeiro,
Como através de um véu fulge o diamante.
Vento frio, mas brando, agita as folhas
Das laranjeiras úmidas da chuva;
Erma de flores, curva a planta o colo,
E o chão recebe o pranto da viúva.
– Machado de Assis, Manhã de inverno –
🌫️ ∞🌧️∞❄️🌫️
A pálida luz da manhã de inverno,
O cais e a razão
Não dão mais ‘sperança, nem menos ‘sperança sequer,
Ao meu coração.
O que tem que ser
Será, quer eu queira que seja ou que não.
No rumor do cais, no bulício do rio
Na rua a acordar
Não há mais sossego, nem menos sossego sequer,
Para o meu ‘sperar.
O que tem que não ser
Algures será, se o pensei; tudo mais é sonhar.
– Fernando Pessoa, A pálida luz da manhã de inverno –
Inevitavelmente, ao ler os trechos acima, construímos nossas paisagens simbólicas interiores de inverno através da imaginação. Assim, nos conectamos com emoções diversas e nos transportamos a lugares e tempos diferentes. Ou seja, muda nosso momento instantâneo.
Em contato com o nosso simbolismo pessoal
As linguagens artísticas nos proporcionam um meio de entrar em contato com o nosso simbolismo pessoal, através das imagens da natureza.
Sobretudo, o simbolismo criativo do inverno nos põe em contato com tudo o que representa quietude, recolhimento, hibernação e estagnação.
É essencial que entremos em contato com esses símbolos através das linguagens simbólicas, representadas nas diversas imagens e linguagens artísticas.
Acima de tudo, esse contato nos faz exercitar o pensamento reflexivo.
Este tipo de pensamento refere-se às diferentes maneiras pelas quais as ideias ou as situações podem ser representadas e expressas e nos ajuda a ampliar a consciência sobre nós mesmos e sobre nossas ações.
Em outras palavras, desenvolver esse tipo de pensamento criativo nos traz resultados benéficos.
Simplesmente, porque organiza as sinapses que resulta em melhor capacidade de planejar coisas e permanecer mais consciente da nossa forma de agir no mundo e das nossas expectativas.
Na maioria das vezes, as imagens nos trazem símbolos difíceis de expressar ou comunicar o incomunicável. Seja lá como for, não devemos buscar racionalizar as imagens e os símbolos.
Portanto, a experiência vale pela contemplação em si, que tem por si só efeito criativo.
De qualquer forma, podemos viver o simbolismo do inverno criativamente, em sua plena manifestação, através da contemplação da natureza, da poesia, das artes e da música.
Então, vamos aproveitar o que o simbolismo do inverno tem mais criativo!🙂🌬️
Abraço,
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