Nesta publicação, vamos falar sobre o que é e qual papel exerce a Imaginação Ativa na Psicoterapia Junguiana.
O papel da Imaginação Ativa na psicoterapia junguiana não é nenhuma novidade.
O termo foi elaborado pelo psicólogo Carl Gustav Jung no século XX. Entretanto, a manifestação daquilo que podemos considerar como imaginação ativa, como estimuladora da criação artística, é antiquíssima.
Os primeiros registros dessa manifestação estão impressos nas cavernas dos nossos ancestrais. Dessa forma, a evolução da imaginação humana caminha simultaneamente com a evolução da consciência.
Grande parte do ato criativo deriva de uma dimensão psíquica inconsciente à qual temos acesso através da imaginação.
Então, tudo o que a imaginação traz do inconsciente se torna matéria prima para a realização da criatividade humana.
Segundo Murray Stein, psicólogo junguiano, a obra humana individual e coletiva é:
“O opus humano — a obra que nós, como indivíduos, e até certo ponto como comunidades, podemos realizar e sobre a qual podemos exercer influência positiva — consiste em tomar consciência do que nos é dado, quer proceda da biologia, da história pessoal ou coletiva, ou do incessantemente criativo inconsciente, e em desenvolver o que recebemos da melhor maneira possível’’
Assim, o inconsciente, como ressalta Murray, é um repositório incessantemente criativo.
Ou seja, o impulso evolutivo da humanidade é, acima de tudo, a criatividade.
A visão da psicologia junguiana ou analítica
Na visão da psicologia junguiana, todo e qualquer ser humano é criativo pois tem imaginação e o potencial desta é incalculável.
A dinâmica da sua criatividade se dá através da fantasia e o seu princípio é a brincadeira.
Embora seja primeiramente associada ao mundo infantil, a brincadeira, no seu sentido mais pleno, é fundamental ao adulto também.
Sem ela, a brincadeira, não há fantasia.
Dessa forma, a psicologia analítica parte do princípio de que devemos levar a sério nossas fantasias e igualmente aceitar a influência criativa do inconsciente, como algo constantemente presente.
Sua influência sobre a vida consciente é o manancial criativo da vida.
O papel da Imaginação Ativa na psicoterapia junguiana
O papel da Imaginação Ativa na psicoterapia junguiana é de auxiliar a consciência na sua aproximação com o inconsciente.
Podemos ver o inconsciente como a mente original do ser humano, como a matriz primária da espécie.
Essa matriz é uma fonte.
É a partir dessa fonte que a consciência evolui constantemente para criar o mundo humano. Assim tem sido há milhares de anos até hoje.
Desse modo, durante o processo evolutivo a consciência atingiu dimensões mais sutis e refinadas.
Contudo, a extensão desse refinamento é proporcional ao seu afastamento da sua matriz ancestral.
A evolução da consciência é um processo contínuo de recapitulação da matriz, concomitantemente com a sua constante atualização. Porém, a humanidade tem atualizado a consciência a partir do aprimoramento da inteligência, a despeito da recapitulação da sua matriz ancestral, o inconsciente.
Nesse sentido, cada um de nós é um microssomo desse processo de atualização e evolução. Afinal, é claro que evoluímos quando inovamos desde que não nos desliguemos de nossas raízes ancestrais. Somente assim poderemos encontrar nosso caminho de vitalidade original.
Nossos ancestrais conheciam esse caminho. Ou seja sabiam como se aproximar desse infinito universo inconsciente. Porém o homem moderno dele se afastou.
Consequentemente, o nosso atual estilo de vida é fortemente voltado ao mundo externo. Esse é o mundo da tecnologia e da ciência. É, antes de tudo, focado na construção e na manutenção do seu status quo nesse mundo externo.
Não há nada de mal nisso. Entretanto, para sustentar essa conquista de estilo de vida, tivemos que negligenciar o inconsciente.
A psicologia analítica procura ajudar a consciência a recuperar o mapa que leva ao inconsciente.
Pois há muito jogamos fora esse mapa.
Jogamos fora o mapa, e agora?
Então jogamos fora o mapa que nos mostrava como se aproximar desse fascinante mundo de fantasias do inconsciente. E agora?
O resultado é um contínuo esvaziamento de significado, que é o potencial criativo, que está no inconsciente.
Isso acontece porque as fantasias foram relegadas às representações externas e coletivas.
Em compensação, o espaço interno do indivíduo em si se esvaziou.
Em outras palavras, imaginação e fantasia se tornaram conceitos marginalizados, da mesma forma como o foi o mundo do inconsciente. Foram exilados e negligenciados, e o mapa continua desaparecido.
Sem o mapa, a consciência se perde. Fica à deriva!
Por outro lado, porém, o inconsciente nunca se desencaminha.
Está sempre pronto para nos surpreender na curva.
Mesmo que a consciência resista, ele se fará vivo.
O inconsciente se manifesta em nossas vidas queiramos ou não
Seja como for, o inconsciente se manifesta em nossas vidas queiramos ou não. Acima de tudo, quando negligenciamos o nosso mundo interior.
Há diferentes maneiras de invasão do inconsciente.
A consciência pode simplesmente se distrair e se deixar levar por pensamentos fantasiosos. Para nós eles podem parecer absurdos, mas na verdade são realidades do inconsciente.
Essas fantasias por vezes assumem tal vivacidade e energia que capturam a consciência totalmente.
É aquela maravilhosa experiência de sonhar acordado.
Por outro lado podemos experimentar o inconsciente de outras maneiras.
Por exemplo, através de emoções invasivas, como repentina e inexplicável alegria ou raiva, que não fazem nenhum sentido.
Então nos perguntamos: O que será que deu em mim?
Esse é o maravilhoso e intrigante universo do inconsciente, que vive dentro de cada um de nós.
É uma fonte secreta que nos influencia de maneira insuspeita e poderosa.
Por isso, temos que aprender como lidar com essa fonte.
É importante estarmos receptivos às suas mensagens para entrarmos em um processo de autoconhecimento e recuperar a energia vital que o inconsciente representa.
Dessa maneira, estar receptivo e em comunicação com o inconsciente nos torna pessoas mais plenas de vitalidade.
Para isso precisamos nos reconciliar com a matriz do inconsciente e encontrar o caminho do elo perdido.
O resgate do mundo perdido de fantasias
A terapêutica junguiana busca resgatar esse mundo “perdido’’ de fantasias. Como resultado, auxilia na expansão da consciência de maneira segura.
Afinal de contas o infinito mundo do inconsciente é como um vasto oceano.
Em contrapartida, a consciência é apenas uma ilha no meio dele.
Se a energia do inconsciente fosse liberada sem intermediação, engoliria essa ilha de uma só vez.
Por isso o processo de resgate precisa de amparo.
Esse resgate pode ser feito com o amparo de um guia. Uma pessoa que já conhece o caminho de exploração das fantasias.
A partir dessa possibilidade, Jung descobriu um meio criativo de intermediação, que chamou de Imaginação Ativa.
Portanto o uso da imaginação ativa na psicoterapia junguiana é um meio resgatar esse potencial criativo, que vem do inconsciente, e traz sentido à vida.
Imaginação Ativa na psicoterapia como meio de alcançar o inconsciente
A Imaginação Ativa na psicoterapia é um meio eficaz de alcançar o inconsciente.
Este consiste basicamente em deixar nossa imaginação brincar com as fantasias.
Além de Jung, outros psicólogos chegaram a essa mesma conclusão.
Até mesmo Freud empiricamente descobriu o poder da brincadeira, como modo de acomodar conteúdos conflituosos da psique.
A abordagem psicológica da Imaginação Ativa na psicoterapia, introduzida por Jung, veio corroborar a importância das fantasias. Além disso, desenvolveu um meio terapêutico inovador.
Primeiramente, em termos terapêuticos, brincar com a imaginação nos coloca em contato com material reprimido do inconsciente.
Através da capacidade lúdica e criativa da imaginação podemos resolver conflitos simbolicamente, pois promove catarse e insights significativos.
Esse meio terapêutico auxilia a acomodação dos conflitos. Igualmente, essa prática conduz ao alívio emocional.
Embora pareça fantasioso, é um dos meio mais potentes de dissolver bloqueios psíquicos, dando oportunidade para que haja renovação criativa.
A chave é deixar-se levar pela imaginação e pela fantasia. Os conteúdos inconscientes que emergem são curativos desde que terapeuticamente mediados.
Imaginação ativa como modelo psicoterapêutico criativo
A Imaginação ativa como modelo psicoterapêutico criativo representa o uso e a ativação de fantasias.
As fantasias ativadas evocam a consciência e chamam a atenção em direção ao inconsciente, através de uma atitude de expectativa, assim como uma criança se alegra em esperar o arremesso da bola.
Imagine a expectativa alegre que sentimos ao termos uma folha em branco e uma caixa de lápis de cor à disposição da nossa imaginação.
Assim sendo, todo o processo criativo envolve uma ideia vaga e sem forma, na expectativa de se materializar.
Isso faz com que a consciência participe ativamente do processo de invocação do insconsciente.
Você se lembra de haver tido alguma vez um sentimento incômodo e inexplicável com relação a uma situação ou a uma pessoa?
Isso nos provoca, mas a consciência resolve não dar atenção a isso – o famoso “deixa para lá”.
Permanecendo passiva, está se colocando a mercê do inconsciente.
Isso pode resultar em conflitos desnecessários e sentimentos equivocados.
Ao passo que se nos concentrarmos no sentimento que nos incomoda e brincar com as imagens que surgem desse exercício de concentração, poderemos dar outra qualidade à emoção.
Isso faz com que a consciência reconheça e compreenda a emoção, tornando-a acessível à organização consciente.
Dessa forma, pode-se concentrar em uma foto ou figura ou história ilustrativa.
Pode ser também através de desenho, pintura, escultura, dança, escrita criativa, dramatizações, etc.
Os meios terapêuticos para facilitar esse processo podem ser múltiplos.
Portanto há muitas portas e muitos caminhos.
De qualquer forma, se nos entregarmos ao processo, cedo ou tarde, a imaginação toma forma.
As experiências criativas de Jung
Jung se submeteu ele mesmo a experiências criativas.
Ele descobriu a imaginação ativa após uma crise psicológica.
Após romper com Freud, passou por um período difícil por causa desse quebra.
Assim a sua imaginação lhe mostrou a saída.
Suas fantasias iniciaram com breves e fugazes impressões visuais que evoluíram para tramas de histórias. Tais estruturas foram ganhando sons e fala.
Um dos resultados foi o Livro Vermelho, que narra e ilustra essas experiências.
Isso que Jung experimentou é um processo criativo que se assemelha à experiência de um artista.
A diferença é que ele focou na condições psíquicas por excelência.
Assim encontrou um meio de transformar a sua experiência em ferramenta psicoterapêutica.
Segundo Jung, no processo terapêutico criativo, permite-se uma inter-relação espontânea de movimentos. Esse sistema dialético leva a um constante processo do criar simbólico, em desenvolvimento auto reflexivo.
O individuo, ou paciente, se coloca como expectador de sua própria criação, permitindo uma atitude psicológica capaz de suportar a tensão entre consciência e inconsciente.
Desse modo, Jung relata que o processo da imaginação ativa na psicoterapia produz um encontro salutar entre esses dois opostos:
“O produto criado é influenciado pelo consciente e inconsciente, dando corpo ao esforço do inconsciente para atingir a luz (da consciência) e o esforço do consciente para atingir a substância (do inconsciente)’’.
Imaginação Ativa: criatividade e produção artística presentes nas atuais práticas de psicoterapia
Vamos falar agora sobre como a criatividade e a produção artística da imaginação ativa estão presentes nas atuais práticas de psicoterapia.
Por intermédio da expressão artística, encontra-se a possibilidade de expansão da consciência e do autoconhecimento.
Essa expressão é mais frequentemente utilizada por psicoterapêutas para aliviar sintomas de estresse e para lidar com conflitos internos e interpessoais.
Além disso pode ser ferramenta de desenvolvimento de recursos cognitivos, através da produção artística.
Na psicoterapia junguiana, a Imaginação Ativa atua como prática de expressões criativas que integram e dão suporte ao tratamento psicológico.
A partir desse princípio, a arte terapia (ou arteterapia) é uma das atuais práticas psicoterapêuticas integrativas que pode dar esse suporte à psicologia.
De qualquer modo, atividades com expressões criativas podem ser utilizadas como prática terapêutica e preventiva.
Dessa forma a Imaginação Ativa, dentro do escopo da arteterapia, pode ser aplicada individual e coletivamente para fins psicológicos, psicopedagógicos e educacionais.
Você já experimentou usar sua expressão criativa para manifestar ativamente a sua imaginação?
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